terça-feira, 1 de novembro de 2011

Contra a corrente



Admito que devo ser um gajo com um feitio muito estranho. Isso revela-se em muitas pequenas coisas... mas uma das formas de “erupção” mais incómodas ataca-me em resultado de estórias como esta, a da “Luta para salvar a pequena Safira”.
Como qualquer pessoa “normal”, no começo também eu sou sensível a estas estórias e dramas humanos. Depois, à medida que vejo que (mais uma vez) essa estória se instala de manhã, à tarde e à noite nos telejornais, “especiais” televisivos, revistas e jornais, a minha inicial empatia vai-se esfumando, até que já só consigo pensar nos milhares e milhares de crianças cujas famílias não podem sequer sonhar com “escolhas”... quanto mais com este tipo de tempo de antena.
Ainda bem que a Safira parece estar livre de perigo! Ainda bem que a Safira, que deve o nome a uma “mensagem” que seres da floresta enviaram, em sonhos, à sua mãe psicóloga, não perdeu a vida com a recusa de tratamento decidida pelos pais...  mas, e desculpem este nadar contra a corrente da simpatia geral, estou farto!
Estou farto das “Maddies” que escondem milhares de crianças negligenciadas.
Estou farto das estórias da “socialite” ou jovem "atriz" de novela que leva um par de estalos... e durante meses serve para esconder os milhares de mulheres (e homens) vítimas de violência continuada.
Estou farto destas campanhas gigantescas, apontadas a casos especiais de pessoas que, ou por terem conhecimentos privilegiados, ou capacidade financeira, ou pura sorte, têm direito a uma cobertura mediática tal... que soterra a indiferença e desprezo com que milhões de seres humanos sem “visibilidade” são tratados todos os dias.
Estou farto destas “oportunidades” para lançar na sociedade as maravilhosas discussões e debates sobre a “livre escolha” e as “questões médicas e jurídicas” suscitadas por estes casos particulares, enquanto se foge como o diabo da cruz de discutir as questões sociais e políticas que afetam todos os outros.
Estou farto destes “critérios jornalísticos” de merda!

16 comentários:

Graciete Rietsch disse...

Também eu estou farta das caridadezinhas e apelo à sensibilidade das pessoas, que apenas ocultam e agravam os problemas.

Um beijo.

gina henrique disse...

Absolutamente de acordo Samuel.Todos estes casos trazidos a terreiro de forma individual, servem apenas para preencher os noticiários e entreter a comunidade.
Se aconteceu algo estranho neste caso foi a rapidez com que agiram quer o tribunal quer a comissão de menores,porque será que não acontece sempre assim ?!

Anónimo disse...

Por uma vez quase que estávamos de acordo: É irritante a exploração de casos destes, é irresponsável, mesmo de forma velada, quase aplaudir que uns pais maníacos usem a filha para provar teses longe de confirmadas arriscando daquela maneira. Talvez induzindo mais atitudes ciganas, fanáticos há muitos.
Já discordo que se regeitem discussões sobre estes assuntos, de forma não pessoalizada, esclarecendo e não fanatizando. E tambem discordo dessa merda de exclusivismo reivindicado dos tais problemas sociais que todos vamos discutindo e devemos continuar a discutir, olha, olha! Ou discutir esta merda que nos atola obriga à exclusividade de plenários contínuos? Posso ver a bola mesmo comendo uma sandocha e apreciar as mamas de uma dama jeitosa? Posso ver os desenhos animados com o puto ao lado sem fazer um plenário?! Onde é que isso impede a discussão da falta de pão?

Branca disse...

E dizes muito bem.
Qualquer pessoa de bom senso está farta! Já não vejo televisão, a não ser "quando o rei faz anos" e esse dia é aquele em que por milagra há algum programa de jeito, o que pode demorar meses, não me apetece ler jornais, a não ser que os títulos da primeira página me digam que posso encontrar algo de interesse e se queres que te diga ando tão ignorante nestas andanças que nem conhecia o caso de Safira, tem havido outros parecidos ao longo do tempo. É bom as pessoas estarem informadas de alternativas, mas também pode ser perigoso, é preciso que sejam bem avaliadas, porque todos os casos são únicos. A propósito temos no nosso país situações incríveis que bem poderiam ser estudadas pela imprensa, temos no IPO de Lisboa, na pediatria, alguém que é um verdadeiro milagre para muitas crianças, não podemos ter a ilusão que todas se salvam, mas há um médico que é único e que tem feito a diferença na vida delas e que tem operado verdadeiroa milagres, alguém que é capaz de brincar, dançar e sentar-se no chão com elas e que investiga constantemente, não vou dizer nomes, se a imprensa quisesse já o tinha descoberto, mas se calhar é bem melhor que não descubra, que o deixem trabalhar em paz.

Estou farta como tu,farta dos políticos, da imprensa e de toda a alienação que anda à volta.

Estes dias aprendi num site de uma organização, como se faz uma palhota num aldeia recôndida de Moçambique e de como se aproveita o material que ficou da velha, uma porta por exemplo e de como os quartos lá dentro podem ter uma cama confortável, se nós lha dermos, apesar do chão de terra. E porque é que a televisão não fala disso? Fiquei doida ao ver aquela construção, á algo tão simples, mas tão importante ao mesmo tempo.

É pena que se explorem notícias até à exaustão, que não deixam de ter a sua importância, mas estas outras podiam até surpreender-nos pela positiva e contribuir para fazer crescer o mundo, apelar à nossa colaboração, fazer crescer o nosso sentido de cidadania e de tarbalho em equipa.

Deixo beijos e levo o anúncio da greve geral para o meu sítio.

do Zambujal disse...

E eu estou contigo. Por inteiro, e inteiramente. Farto deste mundo de aparências, de espectáculo, de farfalhudice, de ternura fingida, de caridadezinhas e zonas, de gente a dizer (e a ter eco) coisas como aquela da zona de conforto que é a do desemprego (porque há subsídios de desemprego). Este mundo está em pino e o sangue está a descer-me à cabeça...

Um grande abraço

Justine disse...

Tens toda a razão para estar farto!Este jornalismo manipulador e de classe enoja e irrita!

samuel disse...

Anónimo (17:05):

Até o perfeitamente óbvio tem que ser dito com o "nível" habitual.
Fantástico!

GR disse...

Magnífico post.
Quando começou mais uma estória da coitadinha, mudei de canal.
Não suporto ouvir o fado da desgraçadinha. E os milhares de cancerosos de todas as idades que não têm dinheiro para os medicamentos, transportes, casa condigna e alimentação adequada às suas necessidades? Quem chora ao ver as imagens na Tv? Claro que não! porque não as passam. Dos que se comovem com Safiras e Quimeras vão para a rua lutar para que os cancerosos tenham melhores condições?
A luta que os doentes de Paramiloidose estão a fazer, quem os está acompanhar? No nosso país o governo dá o novo fármaco, por ser é muito dispendioso.
Nunca vi nenhuma voluntária a reivindicar, a lutar juntamente com qualquer doente.
Voluntárias e historinhas destas passam-me muito longe.
Quero ver novas Leis (que nos tiraram), ou ao menos os Direitos conquistados após Abril que qualquer canceroso era muito mais respeitado e melhor tratado, apesar de hoje se ter avançado muito nos tratamentos, mas nem todos têm possibilidade de os fazerem e alguns são chamados quando já estão no cemitério.

BJS,

GR

Zé Povinho disse...

Tudo o que servir para desviar a atenção das pessoas das dificuldades do dia-a-dia será usado até à exaustão pelos meios de comunicação social desta terra, "independentes" como eles dizem...
Abraço do Zé

Antu disse...

Abaixo a caridadezinha! Vivam os direitos humanos!

Maria do Resgate Coelho Portas de Sousa e Suplício disse...

"Vamos brincar a caridadezinha" como cantava o Barata Moura...

Anónimo disse...

Tem toda a razão e junto me ao seu clube! Nem o meu cachorro é tão submisso e é sempre muito transparente.
Saudações
Vicky

Anónimo disse...

Samuel, o que é que incomodou essa educação comprada na Suiça? Foi talvez a expressão merda que esses ouvidos e língua sensível não gostaram? Ó homem, já te releste, já notaste a quantidade de vezes que avacalhas em palavras e "imagens" o nome dos outros? Não? Bem me parecia que escrevias depois de uma garrafa de Borba!
Vê se ganhas vergonha.
Teu "admirador" das 17:05

samuel disse...

Anónimo (12:43):

Caro anónimo,
O que me "incomodou" não foi a sua educação, ou a ausência dela… característica para a qual me estou a cagar olimpicamente, tal como para o facto de você ser branco ou às riscas azuis, estar vivo ou morto, morar aqui ou na Somália.

Aquilo a que chamei o "nível habitual" foi ao facto de, mais uma vez, não ter percebido patavina do texto… que mesmo assim comentou.

Só isso.

Ah… e bêbado… é a que o pariu! Você conhece-me de algum lado, grande imbecil?!

Maria disse...

Hoje (e atrasada) decidi ler os teus posts e os comentários.
Estou a ganhar alguma experiência...

Abreijos.

Márcio Guerra disse...

Ora, ora... Aqui está um post em que discordo um pouco de alguns pontos de vista do autor e comentadores...

Vi, talvez apenas, na Sic, uma reportagem, em tempo de telejornal.

Ao mesmo tempo em que concordo com esta espécie de «pão e circo» actuais, acho que houve um mérito, a reportagem, e foi aí que me cativou. Havia, não sei se ainda há, desconhecimento de outras técnicas de tratamento, por parte dos médicos portugueses e responsáveis de hospitais, mas cujos pais conheciam. Sabendo dessa taxa de sucesso, ao invés da actual dos actuais métodos aplicados em Portugal, optaram pela de melhor taxa, menos impacto na criança, e que, para mim, é o grande problema aqui... Eles optaram por uma que pode revolucionar o problema do cancro e cujo investigador, que ajudou na resolução do caso, salvo erro, ganhou o Nobél com essa mesma pesquisa.

Para mim, aqui, até deveríamos estar contentes, não com o pão e circo, mas com o conhecimento de novas e melhores técnicas para o caso do problema nos bater à porta...

Penso até que daqui deveria haver pressão no governo para desfazer um pouco do lóbbie das farmácias, pois aqui cura-se, não se dão paliativos...

Merecerei resposta? Bom, opiniões, lá está, mas aberto a discussão do tema com o pouco que sei disto!

Grande abraço

Márcio Guerra

P.s.- Nada disto inviabiliza que as linhas editoriais informativas, e não só, sejam uma m*rda!