A ver se entendo. O Presidente da República, Cavaco Silva, muito recentemente e a propósito do Estatuto dos Açores, teve algumas dúvidas, o que é só por si um facto espantoso, sobre a constitucionalidade de algumas disposições do diploma aprovado por unanimidade na Assembleia da República.
Fez então o que devia, enviando o diploma para apreciação pelo Tribunal Constitucional, das tais disposições que no entender dos seus assessores (ou no seu, vá lá...), iam contra o espírito ou a letra ou as duas coisas, da nossa Constituição.
O TC fez também o que devia. Rapidamente respondeu, dando em alguns casos, razão às dúvidas do PR e noutros não, mostrando que Cavaco Silva... se enganou, facto igualmente, se não ainda mais espantoso!
O caso é que Cavaco, na sua dramática e estrondosa comunicação ao país, havia referido igualmente mais umas coisitas que teriam também que ver com os seus próprios poderes, blá, blá, blá... mas que (pensava eu) não deviam ser inconstitucionais, senão teriam sido incluídas no "pacote" enviado ao TC. Grande engano! Afinal o homem está furioso, envia recados em todas as direcções mesmo do meio da rua, diz que aquelas é que eram as questões mais importantes e que não admite que uma lei ordinária mexa com os poderes de um presidente extraordinário (ou é ao contrário... agora francamente, não sei).
Diz a minha vasta ignorância pobremente esclarecida, que qualquer lei (excepto uma nova Constituição) que tente retirar poderes ao Presidente, é liminarmente inconstitucional.
-Então diga lá, Dr. Aníbal, por que raio não suscitou a inconstitucionalidade da coisa...
-Ah... sei lá... porque era de tal maneira grave, que decidi dar pessoalmente a cara nesta luta, em vez de encarregar “terceiros” de o fazer.
Aqui, volta a dizer-me a minha “ignorância tal e coisa”, que estes a quem o PR chama de “terceiros”, são os juízes do Tribunal Constitucional, o único órgão de soberania com competência para decidir da constitucionalidade ou inconstitucionalidade de qualquer lei.
Pronto. Esta espécie de historial comentado da “crise” fica por aqui, pois se escrever mais alguma vez neste texto, as palavras constitucional, anticonstitucional, constitucionalidade, logo eu que nem sou constitucionalista... dá-me uma coisa má.
Ainda por cima, começo a estar desconfiado que esta “crisinha”, este "conflitinho", não passa de um sketch teatral de má qualidade, que afinal faz parte da “cooperação institucional” e se destina a tapar a nossa vista para o que realmente se está a passar na vida dos portugueses, como a real crise económica, o desencanto, o desânimo, os célebres empregos criados por Sócrates, que afinal, em grande número, são também uma aldrabice, o Código Laboral que está aí à porta, a descida de trinta por cento no preço dos medicamentos genéricos, que afinal era mentira, esta novidade da comparticipação do Estado na compra de medicamentos que passará a ser fixa, seja o medicamento barato, caro, ou muito caro, fazendo os doentes passar a pagar muito mais, etc, etc, etc, etc...
A ser assim, não é que a “função” esteja desenquadrada com a “figura”, mas é triste ver um Presidente da República a pôr-se à frente do Governo, fazendo de espantalho e gesticulando muito, para desviar as atenções das pessoas.
Mas lá está... posso estar muitíssimo enganado e o senhor esteja a fazer tudo isto... mas sem querer.
Ah... e desculpem a quilometragem deste texto. O Sábado não se fez para uma maratona destas. Se chegaram até aqui, obrigado pela grande atenção! :)