segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

O sr. José Carlos não está...


...daqui quem fala é uma tia velha! 
Por vezes ainda reforçava com "doente" e a voz mais trémula.
- Ó Zé Carlos! Vai-te lixar...
E ele ficava invariavelmente encavacado por não ter percebido a tempo que quem estava ao telefone era "irmão", ou "sobrinho", ou "sobrinha", tudo graus bastante elevados na hierarquia da família de amigos.
Só tenho uma cantiga feita a meias com o José Carlos Ary dos Santos. Como compensação, é um poema absolutatamente glorioso sobre os mártires do fascismo na Guerra Civil de Espanha.
Quando ia certamente começar a trabalhar muito mais com ele, partiu.
São já vinte e quatro anos a gerir (por vezes mal) este nó na garganta e a sua ausência absolutamente depropositada.

"As portas que Abril abriu" (excerto) 
Ary dos Santos (1977)
José Carlos Ary dos Santos (Dez. 1936 / Jan. 1984)



22 comentários:

Maria disse...

Fiquei arrepiada.....
Este teu post avivou-me a memória de tanta coisa que estava guardada...
... porque é que nos emocionamos tanto quando vamos pra velhos?....

Obrigada, Samuel.
Um beijo

GR disse...

Em 2004 na Festa do Avante fez-se uma bonita homenagem ao nosso querido Ary.
Na passagem dos vídeos muitos não aguentaram a emoção, choraram!
Apesar de estares sempre ao nosso lado, tanta falta nos fazes ARY.

Samuel,
Comoveu-me, o teu texto tão sentido.

GR

maria_maia disse...

Que bom ter passado agora por aqui...

E porque o momento é de recordar, também vou partilhar o que nunca contei.
Apetece-me.

Quando havia comícios e os cantores ( os cantigueiros e outros amigos) iam até à ilha da Madeira, faziam sempre um pouco de “turismo”, visitando obrigatoriamente alguns locais identificados com as belezas naturais da ilha. Numa dessas deslocações, também foi o ZÉ Carlos. No final do domingo, a malta acampou numa casa de aldeia situada ao concelho de Machico. Vindo de um comício seguido de passeio, o pessoal estava com fome. O jantar era assado de peixe-espada preto, preparado no forno a lenha. O forno era exterior à casa. Entre a cozinha e o coberto com a lareira e o forno de lenha, ficava um espaço coberto por videiras. Nesse espaço havia uma mesa e alguns bancos. O ZÉ Carlos sentou-se à cabeceira, no lado norte, onde não atrapalhava quem se esforçava nas tarefas do jantar e ficou tranquilamente a observar os preparativos culinários. Ali perto, na torneira do tanque da roupa, eu lavava as folhas de viçosas alfaces (ai se a ASAE sabe disto!) enquanto conversávamos sobre a vantagem das lareiras não serem rentes ao chão. Quando deram pelo seu distanciamento do resto do grupo, vieram inquiri-lo. Calmamente, ele cruzou as mãos sobre a mesa e declarou:
- Daqui não saio!
E inspirando longamente aquele ar campestre, continuou:
- Como me sinto tão bem aqui!... Não trocava este cantinho pelo melhor restaurante do mundo!....

E não precisou trocar. Todos vieram fazer-lhe companhia e a mesa acrescentada, voltou a ser posta naquele cantinho, ali mesmo, à saída do forno....

Cerca de trinta anos são passados, mas conservo ainda a sua imagem, a sua voz e palavras, como se este episódio tivesse acontecido a escassas horas...
Há pessoas que nos deixam memórias que o tempo jamais apaga...

Carminda Pinho disse...

Não conheci pessoalmente Ary dos Santos. O que conheço dele, são os bonitos poemas que escreveu. Alguns deles resultaram em canções que para sempre ficarão na nossa memória e, dos nossos filhos.
Ary foi e continua a ser, porque os poetas nunca morrem, um dos grandes, da Liberdade.

amigona avó e a neta princesa disse...

Obrigada Samuel!Mais não consigo dizer...

Mariazinha disse...

Olá Samuel
Obrigada pela sua visita ao meu humilde blog.
Lembro-me muito bem de tantas vezes
o ouvir, ao vivo ás cavalitas do meu pai. Eu tive o privilégio de viver intensamente a revolução.
Tinha 11 anos e os meus pais faziam
questão de me levar para todo o lado. Ainda bem que assim foi,pois foi um dos períodos mais bonitos da história recente do nosso país.
O Zé Carlos é para mim unico.É o poeta do amor e da raiva.
Obrigado Samuel pela sua linda voz e pelo seu contributo para a liberdade de todos nós.
Um abraço

Anónimo disse...

Grande voz que se calou, bonita e sentida homenagem a um poeta português. Beijo

gaivota disse...

josé carlos ary dos santos
o eterno poeta
ficará sempre irremediavelmente na presente memória de todos!
foi um homem fantástico, um poeta sem limites um declamador sentido
um beijinho

Crixus disse...

Quando nasci, já o Ary dos Santos tinha morrido. Mas tambem me arrepio quando ouço os seus poemas, choro quando ouço a Amendoa Amarga ou o Cavalo á Solta, sem nunca esquecer a enorme alegria de poemas carregados de ironia como a Tourada. Há dois injustiçados com o Ary. Nós (os que o amamos) que o perdemos tão novo e ele que não é reconhecido como aquilo que realmente é. Um dos maiores poetas portugueses de sempre.

Um Abraço

jorge esteves disse...

O Ary não partiu! Essa é a Imortalidade. Vive enquanto houver memória. Dentro de nós.

p.s. - obrigado pela visita. Volte sempre. Por aqui também o mesmo farei...)

abraço!

Anónimo disse...

Nos meus tempos de juventude rebelde e de luta contra o fascismo, habituei-me a ouvir as canções do Zé Carlos, não com muita frequência, confesso, mas quem não se recorda da "tourada" uma autêntica pedrada no charco, e já depois da Liberdade ainda de quando em vez cantaroleio "depois da fome e da guerra, da prisão e da tortura, ví abrir-se a minha terra, em bocados de ternura". É lindo.....

Estes homens são eternos

Abraço

Anónimo disse...

Ary estará sempre connosco na nossa memória e no nosso coração.
Os poetas são eternos... obrigada Samuel pela partilha deste seu sentir.
Um abraço.

avelaneiraflorida disse...

"E a força da vida " aqui está!!!! "Muito maior do que a morte"!!!!

enquanto os seus versos forem cantados, ditos, sentidos!
"Brigados"amigo Samuel, por este TESTEMUNHO!!!!
bjkas!

BlueVelvet disse...

Tive o privilégio de conhecer pessoalmente o Ary.
Era visita de casa dele e era uma miúda.
Ele achava-me graça.
Assiti á feitura de algumas das conções mais conhecidas dele, e foi com muito orgulho que me vi sentada na 1ª fila do teatro, assistindo à revista " uma no cravo outra na ditadura"
Lembro-me de muita coisa dele, coisas de que aqui não interessa falr, mas quando penso no Ary, oiço logo aquela voz grossa dele, dizendo: Poeta castrado, não!
Que Homem! Que tempos!
Que saudade!
Obrigada pela lembrança.
Beijinhos

Gasolina disse...

O Sr. José Carlos há-de estar sempre.
Este é daqueles que permanece de pé.

Um abraço Samuel

Porca da Vila disse...

Nunca mais Abril foi Abril sem o Ary... O que ele não gritaria hoje da desvergonha que lentamente nos vai arrastando para o precipício...

Recordá-lo-ei sempre como um dos maiores do seu tempo. E do meu, que já ia nos 20 em 74...

Um Xi Grande

Luis Eme disse...

Ele continua por cá e nós não o esquecemos...

A força das suas palavras é única.

abraço

Ad astra disse...

o que gostei deste post
fez-me viajar ate à minha infância

abraço

Anónimo disse...

O zé Carlos é património nacional, por mérito próprio!
Para nós comunistas é gratificante sabermos que partilhava dos nossos ideais!
Belas páginas da nossa história escreveu este poeta de ABRIL e do POVO!
josé manangão

ana v. disse...

Grande, enorme poeta, o Ary!

Rosa dos Ventos disse...

Chorei!...
Nunca somos capazes de entender as ausências despropositadas...

Abraço

Anónimo disse...

« FAZ COM QUE A FORÇA DA VIDA
SEJA MAIOR DO QUE A MORTE»

A LIÇÃO MAIOR PARA SEMPRE, PARA TODOS NÓS....