terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Estupefacção e uma pergunta legítima



A Irlanda é um país que consegue ser tão extremamente católico, como extremamente protestante. Os resultados de tanta devoção não têm sido brilhantes. Como se não bastasse o facto de ainda existir um tão grande número de irlandeses que acham normal matar o seu vizinho apenas por este professar uma religião diferente da sua, há ainda a dor e a vergonha das muitas centenas de vítimas de pedofilia, em que são protagonistas, recorrentemente, padres e outros responsáveis religiosos. Este caso dos últimos “rebates de consciência” (?) de que nos chegam notícias é apenas uma ponta do iceberg.

Seria de esperar que os políticos, numa situação destas, se concentrassem em criar condições educacionais e culturais que promovessem a paz social, nem que começassem pela famosa “tolerância”, palavra e conceito que detesto, mas que pode ser o primeiro pequeno passo rumo uma saudável convivência, compreensão e harmonia. Mesmo no que diz respeito aos hediondos crimes de pedofilia que têm marcado várias gerações, esperar-se-ia uma atitude firme, a começar nas próprias igrejas e a acabar na legislação, da qual deveriam desaparecer, definitivamente, quaisquer laivos de protecção aos poderosos, de “justificação”, ou atenuantes para tais crimes.

Puro engano! O poder político fez entrar em vigor, desde o princípio deste novo ano, uma lei que pune com pesadas multas... a blasfémia!

Não quero entrar em pormenores sobre o que penso realmente de uma lei que vem dar base legal às sempre tão “lúcidas e fundamentadas” indignações de carácter religioso que ao longo de séculos tanto têm contribuído para o nosso atraso civilizacional.

Quero apenas avisar os miúdos e miúdas que forem vítimas de abusos por parte de religiosos profissionais e outros adultos (principalmente os famosos), que devem ter muito cuidado com o que dizem sobre a Santa Madre Igreja e sobretudo sobre o “deus” que os pôs no caminho de tais “pastores”, não vão os seus desabafos ou protestos serem classificados como blasfémias.

Se os tribunais irlandeses forem minimamente aparentados com os portugueses, muito mais depressa serão condenados pelas blasfémias, do que os seus agressores verdadeiramente incomodados por serem pedófilos.

Pergunta legítima: Estarão os religiosos, sempre tão prontos a fazer pagar, até os ateus, pelo que consideram blasfémias, dispostos a também pagarem efectivamente às vítimas dos milhares de crimes cometidos em nome dos seus deuses... em vez de se ficarem pelos atabalhoados e já recorrentes pedidos de desculpa?


Adenda: Esclareço que não dividi a Irlanda em Irlanda do Sul e Irlanda do Norte, porque não quis. Porque acho que aquela aquele “fenómeno” de um pedaço da Irlanda, ao Norte, estar ocupado pelos ingleses não torna por si só o território noutro país, habitado por outro povo. Apenas degrada a convivência entre os cidadãos e extrema as posições. Se depois de se livrarem das sanguessugas inglesas continuarem por muito tempo a ser Irlanda do Norte... voltaremos a falar.

Resumindo, esta lei é estúpida a Norte, a Sul, Este e Oeste!

14 comentários:

Maria disse...

Posso responder?

NÃO!

ou

O que estás para aí a inventar?

:)))

São disse...

Nada de surpreendente, desgraçadamente!

Existe pena de excomunhão desde há cinco ou seis Papas atrás contra as vítimas que denunciarem abusos sexuais efectuados por elementos da igreja católica. POrque não são as pessoas que têm que ser defendidas , mas sim a instituição, isto é, a Igreja Católica!

O cristianismo criado por Paulo de Tarso baseia-se na repressão e no medo.Aliás, foi ele o grande traidor ao Mestre, não Judas.

Quanto a blasfémias, a própria existência do Vaticano é a maior delas

Peço desculpa pela extensão.

Abraços.

salvoconduto disse...

Sincronizados uma vez mais. Não me alongo pois nunca se sabe, poderei serei multado. 25.000 euros agora fazem-me falta...

Abraço.

Dylan disse...

Só queria dizer que quem mata por religião são os habitantes da Irlanda do Norte, não na Rep. Irlanda (Eire).

Dylan disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Daniel disse...

Samuel, a lei é parva, sem dúvida. Mas há por aqui alguns equívocos. Um deles o Dylan já referiu. E, no Ulster, não se mata por motivos religiosos propriamente ditos, mas políticos. Tal como há séculos já acontecia.
A lei, que é tonta, não se refere apenas a blasfémias desta ou daquela religião. Quem não as conhecer todas é que corre o risco de empobrecer, pois até o exaltar o aspecto de uma pode ser uma terrível blasfémia para outra ou outras.

Julieta Real Ferreira disse...

Oops!

Aterrei na Idade Média?

Hã?

Voltou a Inquisição?

Hein?

samuel disse...

Maria:
Fico com a primeira.

São:
Tens razão. Aquele Saulo de Tarso não era flor que se cherasse... mas o Paulo em que se “transformou” não o melhorou em quase nada.

Salvoconduto:
É uma data de massa! ☺

Dylan:
A sério? Nunca tinha ouvido falar...
Não amigo. Não os distingui de propósito. O anacronismo daquela “coisa” lá ao Norte, sob o domínio criminoso do Reino Unido só tem piorado a já má situação de uma Irlanda que devia ser una.
De qualquer modo, se isso for um erro... ao resto não altero uma vírgula (a menos que esteja mal posta...).

Daniel:
Sobre a questão Norte-Sul, já respondi ao Dylan.
Sobre os “crimes políticos”... essa foi sempre a principal desculpa para os que matam em nome dos seus deuses.
Portanto resta a verdade (em que concordamos) de que a lei é tonta, tão verdade como é tonta a noção de blasfémia, em que só fica mal na fotografia o que se diz ofendido, já que considera a sua crença muito mais sagrada do que a crença, ou falta dela, dos que alegadamente blasfemam... e aqui já não concordaremos, suponho.
Acredita que pode ser muito “ofensivo” ser obrigado a acatar as ordens, preceitos, manias e estados de espírito de deuses que estamos firmemente convencidos que nunca existiram. Pelo menos tão ofensivo como é para os crentes disto e daquilo, verem que há quem não aceite as suas crenças.
Acho mais avisado estabelecer o empate técnico e, pelo menos como a maioria dos açorianos, dar a César o que é de César... ☺ ☺ ☺

Julieta Real Ferreira:
Por vezes parece, não é?


Saludos gerais!

Graciete Rietsch disse...

Queria deixar aqui apenas uma ideia minha. O problema da Irlanda não é religioso. Católicos e protestantes apoiam quem lhes convém. Já viram "BRISAS de MUDANÇA" um filme de que gostei muito? Esclarece muita coisa e até se adapta aos tempos políticos de hoje. Um beijo.

Rui disse...

Pedofilia na "Igreja". Já não sei o que mais me revolta: se os actos pedófilos ou se a hipocrisia das hierarquias !...
.

Antuã disse...

Onde há sacerdotes há corrupção e crime.

Fernando Samuel disse...

É estúpida até dizer chega...

Um abraço.

Anónimo disse...

Poxa, e a gente pensa que certas coisas nunca mais podem acontecer, e elas acontecem. Acho que certo estava Marx ao dizer que a história era a "única ciência".

Por outro lado, sempre tive uma admiração pela Irlanda....

samuel disse...

Graciete:
A tua ideia está certa. Todas as mortes em nome de Deus são na realidade motivadas por tudo menos religião...
Deus, como quase sempre, é apenas uma desculpa.

Rui da Bica:
Eu vou pela hipocrisia das hierarquias. Os pedófilos, numa parte dos casos, são doentes mentais, enquanto os que os encobrem são apenas calculistas.

Antuã:
Salve as excepções!

Fernando Samuel:
Muito estúpida... vão descobri-lo não tarda!

Walkyria:
Pobres irlandeses, que na esmagadora maioria não têm nada que ver com esta lama e ainda por cima fazem música “divinal”!


Abraços plurais!